Fonte: http://marcusreis.com
Ainda temos poucos dados do atentado em Boston. Até que o governo se pronuncie e revele a linha de investigação, é bom termos cuidados em analisar o caso. Entretanto, as pessoas sempre me perguntam como os agentes públicos fazem a investigação de um atentado terrorista.
Primeiro, a área da explosão é isolada. A área de isolamento na doutrina das policias dos EUA é traçada como um círculo imaginário, onde o raio desta circunferência é a distância do epicentro da explosão até o último objeto achado que provavelmente foi resultado da explosão. Este é o perímetro externo, onde não deve haver a presença de estranhos. Claro que se ainda existirem vítimas, continuarão sendo resgatadas.
O epicentro da explosão é o local onde se originou, ou seja, onde os objetos são arremessados e existem marcas de fragmentos ou chamuscados ou queimados com sinais de dispersão em 360º. Aí provavelmente foi o local do epicentro.
Determinado o perímetro externo, esta área é isolada pela polícia. Se for o caso, uma área muito grande, como foi em Oslo (Noruega), chama-se os militares para apoio. Agora será determinado o perímetro interno, que é a área de busca, onde as equipes de busca procurarão tudo que possa estar relacionado ao atentado para auxiliar a perícia. Esta área é determinada como a metade do raio do perímetro externo. Aí, como essa metade de raio, traça-se um círculo e a área interna a esse círculo é o perímetro interno ou de busca. Portanto, ainda é cedo para sabermos o que aconteceu em Boston, porque a busca nessa área por pistas do atentado apenas começou.
O esquema abaixo ilustra o que falamos:
Grupos terroristas possuem objetivos, estratégias e táticas que podem identifica-los. A partir do entendimento dos fragmentos do atentado e do depoimento das vítimas, começa-se a tentar descobrir o objetivo do atentado. Terroristas possuem cinco objetivos básicos: mudança territorial, mudança de regime, mudança de comportamento político, afirmação do status quo e o controle social de determinado grupo social. Para um melhor entendimento, vejamos a explicação de cada objetivo abaixo:
1. mudança do regime – substituição do governo com a alteração da forma de administrar de determinado Estado. Grupos como o as Sendero Luminoso (Peru) e Brigadas Vermelhas (Europa e Japão) são alguns exemplos de organizações que perseguiam a mudança do regime em seus países ;
2. mudança territorial – separação de determinado território do atual Estado para a criação de novo ente estatal ou para anexação a outro Estado. O IRA e o ETA são exemplos de grupos que perseguiam esse objetivo;
3. mudança de política – busca a alteração da política e forma de atuar de determinado Estado, como acontece no caso da Al Qaeda, que tenta modificar a política externa estadunidense no Oriente Médio;
4. controle social – estabelecer controles principalmente a determinados grupos sociais e, em menor grau, ao governo. Um exemplo é a atuação do grupo racista Klu Klux Klan, que tenta estabelecer um controle social à população afro-americana dos EUA. Outro exemplo são os grupos terroristas anti-aborto, que assassinam médicos que praticam o aborto com o intuito de assustar e impedir que outros médicos façam abortos;
5. mantença do status quo – visam a suportar ou a apoiar determinados governos ou sociedades, impedindo qualquer mudança política no Estado. As Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC) são um exemplo de grupo com esse objetivo, praticando o terror contra populações que apoiavam a mudança de regime naquele país.
Saber o objetivo ajuda a eliminar determinados grupos terroristas. Por exemplo, um grupo separatista nunca ataca a população do território de origem. O terrorista ideológico busca sempre atacar símbolos da ideologia contrária. No caso de Boston, o ataque foi à população dos EUA, sem identificação de determinada minoria ou grupo social. Foi um ataque indiscriminado a civis, normalmente comum nos atentados jihadistas ou de grupos anti-governo dos EUA (o famoso terrorismo interno).
A partir do objetivo, devemos entender a estratégia. Estão ligadas! As estratégias mais utilizadas são:
Atrito – tentam os terroristas mostrar ao governo constituído que possuem capacidade e força, pressionando a aceitação do demandado. Ex. utilização de terroristas suicidas para causar medo e coagir o Estado;
Intimidação – dirigidos contra a população, mostrando a ela que os terroristas são fortes e o governo não pode protegê-la. Ex. ataques a delegacias e símbolos do poder do Estado realizados pelo PCC em maio de 2006;
Provocação – por intermédio de um atentado terrorista tentam causar uma reação exagerada do governo, colocando a população contra este ente. Ex. atentado do 11 de setembro de 2001 forçou uma reação exagerada do governo americano tornando este antipático à população muçulmana;
Sabotagem da paz – estratégia que busca minar e destruir uma possibilidade de acordo com determinada facção ou grupo. Ex. o caso do Hamas nos acordos de Oslo, da década de 1990, que por intermédio de sucessivos atentados contra Israelenses, durante as negociações desse acordo, impediu a paz entre Israel e a Autoridade Palestina;
Competição – normalmente quando existem dois ou mais grupos terroristas disputando determinado ganho político. Um dos grupos tenta superar a ação do outro mostrando ao governo e à sociedade que é mais forte. Ex. escalada da violência na Colômbia pela Farc, na década de 1980, mostrando que seriam mais fortes que o ELN.
A estratégia em Boston pode ser a do atrito, intimidação e até mesmo provocação.
Também devemos conhecer as táticas. Determinados grupos possuem na tática a sua assinatura. Por exemplo, as FARCs colombianas utilizam o sequestro e explosivos. O ETA utilizava bombas e assassinatos seletivos. O explosivo é muito utilizado como tática pela vantagem na relação custo benefício. São relativamente baratos e causam muito dano. Lembremos que a tática de explosões indiscriminadas contra civis não é utilizada por grupos separatistas, pela propaganda contrária que geram. Mas são muito utilizadas por grupos de terrorismo religioso e terrorismo interno de cunho político.
Segundo Bolz et al. (2002), no livro The Counterterrorism Handbook: tactics, procedures and techiniques, existem quatro importantes táticas utilizadas por terroristas, na seguinte ordem de frequência:
- Explosões;
- Assassinatos;
- Sequestros;
- Toma de reféns em aeronaves, navios, trens etc.
A utilização de explosivos é a tática mais utilizada, chegando a quase 80% de toda a violência relacionada ao terrorismo no mundo. Bombas são populares, relativamente baratas e com alto potencial de lesividade, motivo pelo qual ainda são as preferidas por grupos de terror. É a tática preferida de grupos radicais islâmicos, especialmente pelo alto grau de mortalidade e de tensão causado.
Assassinatos são mais seletivos, ao contrário do uso de explosivos. Visam a alvos simbólicos, como autoridades, representantes religiosos, artistas etc. São ações que desejam enviar uma mensagem ao Estado ou à sociedade. Foi a tática mais utilizada pelos grupo ETA, na Espanha, que assassinou diversos representantes do Estado nos últimos 30 anos, como vereadores, juízes, policiais etc.
Sequestros também são seletivos, focando, como nos assassinatos, alvos simbólicos do Estado e da sociedade que se quer atingir. São ações muito utilizadas pelas Farcs na Colômbia e foram muito usadas por grupos de esquerda no Brasil e na Europa nas décadas de 1960 e 1970.
A tomada de reféns se difere dos sequestros pela não seletividade específica de determinada pessoa como alvo. Visa a um grupo de pessoas que porventura se encontrem a bordo do alvo selecionado, como um avião, um navio etc. Foi uma tática muito utilizada nos anos 1960 e 1970 por grupos radicais islâmicos que queriam chamar a atenção para a causa palestina.
A análise dos órgãos policiais e de inteligência devem sempre buscar respostas a esses itens: OBJETIVO, ESTRATÉGIA E TÁTICA. Qual o objetivo, qual estratégia e qual tática foi utilizada? Somente com a análise segura e apurada dos fragmentos resultantes do atentado essas perguntas serão respondidas. Por isso, ainda é cedo para especularmos, mas seguramente o trabalho dos investigadores será pautado por essa análise.
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